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"Alguém cujo espírito e força mental, se fortaleceram através das lutas com uma atitude de nunca desanimar não deve encontrar dificuldades em enfrentar nenhum desafio, por maior que ele seja. Alguém que suportou longos anos de sofrimento físico e agonia mental para aprender um soco ou um chute, deve ter condições de encarar qualquer tarefa, por mais difícil que ela seja, e de executá-la até o fim. Sem dúvida nenhuma, uma pessoa com essas características aprendeu verdadeiramente o Karatê-Do."

Gichin Funakoshi

Gichin Funakoshi nasceu em Shuri, Okinawa, em 1868, o mesmo ano da Restauração Meiji. Funakoshi era filho único, e logo após o seu nascimento fora levado para a casa dos seus avós maternos, com quem foi educado e aprendeu poesias clássicas chinesas. Aos 11 anos de idade iniciou seus estudos, com o mestre Asato, no duro sistema Naha-Te (força e contração), e com o mestre Itosu no sistema Shuri-Te (velocidade e elasticidade). Foi perto do fim do ano de 1921, mestre Funakoshi, numa exposição de educação física promovida pelo governo Japonês em Tokyo, foi escolhido como representante da ilha, para fazer oficialmente a primeira demonstração pública do Okinawa-te à capital japonesa. Mestre Funakoshi reestruturou e codificou as técnicas de luta passando a chamá-las de Karatê Do. Funakoshi sempre enfatizava o desenvolvimento do caráter e autodisciplina nas suas narrações.

"Assim como um vale vazio pode ecoar o som da voz, do mesmo modo a pessoa que segue o Caminho do Karatê Do deve esvaziar-se livrando-se de todo egoísmo e ambição. Tornar-se vazio interiormente, mas reto por fora. Este é o significado verdadeiro de vazio no Karatê Do."

O Mestre Gichin Funakoshi além de Mestre de Karatê era também, exímio poeta e quando escrevia os seus poemas usava o pseudônimo de SHOTO (que significa: ondas de pinheiro). (Você pode ler alguns de seus pensamentos aqui neste site entre aspas na cor preta). Ele usava este nome porque a cidade nativa de Shuri, local do seu nascimento, era rodeada por colinas com florestas de pinheiros RYUKYU e vegetação subtropical; entre elas estava o Monte Torao. A palavra torao significa: cauda de tigre; e era particularmente adequada porque a montanha era estreita e tão densamente arborizada que realmente tinha a aparência de uma cauda de tigre quando vista de longe.

Treino em Shuri, Okinawa

Por volta de 1933, Funakoshi desenvolveu exercícios básicos para prática das técnicas em duplas. Tanto o ataque de cinco passos (Gohon Kumite) como o de um (Ippon Kumite) foram usados. Em 1934, um método de praticar esses ataques e defesas com colegas de um modo levemente mais irrestrito, semi-livre (Ju Ippon Kumite), foi adicionado ao treinamento. Em 1935, foi publicado seu livro: "Karatê Do Kyohan". Este livro trata basicamente dos Kata. Funakoshi era Taoísta, e ele ensinava Clássicos Chineses, como o Tao Te Ching de Lao Tzu, enquanto ele estava vivendo em Okinawa. Funakoshi era profundamente religioso. Ele tinha muito medo de que o Karatê se tornasse um instrumento de destruição, e provavelmente queria eliminar do treinamento algumas aplicações mortais dos Kata. Então, ele parou de fazer essas aplicações. Ele também começou a desenvolver estilos de luta que fossem menos perigosos. Funakoshi teve sucesso ao remover do Karatê técnicas de quebras de juntas, de ossos, dedos nos olhos, chaves de cotovelo, esmagamento de testículos, criando um novo mundo de desafios e luta em equipe onde somente umas poucas técnicas seriam legais. Ele fez isso baseado nos seus propósitos e com total conhecimento dos resultados.

Demonstração

Em 1936, Funakoshi mudou os caracteres Kanji utilizados para escrever a palavra Karatê. O caracter "Kara" significava "China", e o caracter "Te" significava "Mão". Para popularizar mais a arte no Japão, ele mudou o caracter "Kara" por outro, que significa "Vazio". De "Mãos Chinesas" o Karatê passou a significar "Mãos Vazias", e como os dois caracteres são lidos exatamente do mesmo jeito, então a pronúncia da palavra continuou a mesma. Além disso, Funakoshi defendia que o termo "Mãos Vazias" seria o mais apropriado, pois representa não só o fato de o Karatê ser um método de defesa sem armas, mas também representa o espírito do Karatê, que é esvaziar o corpo de todos os desejos e vaidades terrenos. No mesmo ano (1936), foi fundado o primeiro DOJO Oficial de Karatê, pelo Comitê Nacional e devido aos feitos do mestre Funakoshi, foi batizado com o nome de SHOTO-KAN. Daí surgiu o nome de uma escola (estilo) que até hoje é cultivada em várias partes do mundo. SHOTO (pseudônimo de Funakoshi) + KAN (escola, classe...) = Escola de Funakoshi. Funakoshi tinha 71 anos em 1939, e foi quando ele deu o primeiro passo dentro de um Dojo de Karatê em 29 de Janeiro. O prédio foi feito de doações particulares, e uma placa foi pendurada sobre a entrada e dizia: "Shotokan". "Sho" significa pinheiro. "To" significa ondas ou o som que as árvores fazem quando o vento bate nelas. "Kan" significa edificação ou salão. "Shoto" era o pseudônimo que Funakoshi usava para assinar suas caligrafias quando jovem, pois quando ele ia escrevê-las se recolhia em um lugar mais afastado, onde pudesse buscar inspiração, ouvindo apenas o barulho do pinheiros ondulando ao vento. Esse nome dado ao Shotokan Karatê Dojo foi uma homenagem de seus alunos.

A necessidade de um treinamento nas artes militares estava em crescimento. Jovens estavam se amontoando no Dojo, vindos de todas as partes do Japão. O Karatê foi de carona nessa onda de militarismo e estava desfrutando de uma aceitação acelerada como resultado. Finalmente o Japão cometeu um grande erro. O bombardeio das forças navais americanas em Pearl Harbor a 7 de Dezembro de 1941 foi algo além da conta. Numa tentativa de prevenir que as embarcações americanas bloqueassem a importação japonesa de matéria-prima, os japoneses tentaram remover a frota americana e varrer a influência Ocidental do próprio Oceano Pacífico. O plano era bombardear os navios de guerra e os porta-aviões que estavam no território do Hawai. Isto deixaria a força da América no Pacífico tão fraca que a nação iria pedir a paz para prevenir a invasão do Hawai e do Alasca. Infelizmente, o pequeno Japão não tinha os recursos, força humana, ou a capacidade industrial dos Estados Unidos. Com uma mão nas costas, os americanos destruíram completamente os japoneses na Ásia e no Pacífico. Uma das vítimas dos ataques aéreos foi o Shotokan Karatê Dojo que havia sido construído em 1939. Com a América exercendo pressão em Okinawa, a esposa de Funakoshi finalmente iria deixar a ilha e juntar-se a ele em Kyushu no Sul do Japão. Eles ficaram lá até 1947. Os americanos destruíram tudo que estava em seu caminho. As ilhas foram bombardeadas do ar, todas as cidades queimadas até o fim, as colinas crivadas de balas pelos cruzadores de guerra de longe da costa, e então as tropas varreram através da ilha, cercando todo mundo que estivesse vivo. A era dourada do Karatê em Okinawa tinha acabado. Todas as artes militares haviam sido banidas rapidamente pelas forças ocupantes americanas. Primeiro uma, depois outra bomba atômica explodiram sobre as cidades de Hiroshima e Nagasaki. Três dias depois, bombardeiros americanos sobrevoaram Tokyo em tal quantidade que chegaram a cobrir o Sol. Tokyo foi bombardeada com dispositivos incendiários. Descobrindo que o governo do Japão estava a ponto de cometer um suicídio virtual sobre a imagem do Imperador, cartas secretas foram passadas para os japoneses garantindo sua segurança se eles assinassem sua "rendição incondicional". O Japão estava acabado, a Guerra do Pacífico também, mas o pesadelo de Funakoshi ainda havia de acabar.

Funakoshi e seus alunos

Então, Gigo (também conhecido como Yoshitaka, dependendo como se pronunciava os caracteres do seu nome), filho de Funakoshi, um promissor jovem mestre de Karatê no seu próprio direito, aquele que Funakoshi estava contando para substituí-lo como instrutor do Shotokan, pegou tuberculose em 1945 e morre enquanto teimosamente recusa-se a comer a ração americana dada ao povo faminto. Funakoshi e sua esposa tentaram viver em Kyushu, uma área predominantemente rural, sob a ocupação americana no Japão. Mas, em 1947, ela morre, deixando Funakoshi retornar a Tokyo para reencontrar seus alunos de Karatê que ainda viviam. Depois que a guerra havia acabado, as artes militares haviam sido completamente banidas. Entretanto, alguns dos alunos de Funakoshi tiveram sucesso em convencer as autoridades que o Karatê era um esporte inofensivo. As autoridades americanas concederam, mais por causa que naquela época eles não tinham idéia do que Karatê fosse. Também, alguns homens estavam interessados em aprender as artes militares secretas do Japão, então as proibições foram eliminadas completamente em 1948.

Em Maio de 1949, os alunos de Funakoshi movem-se para organizar todos os clubes de Karatê universitários e privados numa simples organização, e eles a chamaram de Nihon Karatê Kyokai (Associação Japonesa de Karatê). Eles nomearam Funakoshi seu instrutor chefe. Em 1955, um dos alunos de Funakoshi consegue arranjar um Dojo para a NKK. Em 1957, Funakoshi tinha 89 anos de idade. Ele foi um professor de escola primária e um estudante de Karatê. Ele mudou-se para o Japão (e não é um pequeno ato de coragem) e trouxe o Karatê consigo em 1922, dando ao Japão algo de Okinawa com seu próprio jeito pacifista. No processo, ele perdeu um filho, sua esposa, o prédio que seus alunos fizeram para ele, seu lar, e qualquer esperança de uma vida pacífica. Ele suportou uma Guerra Mundial que resultou em calamidade nacional, e ele treinou seus jovens amigos e conheceu suas famílias apenas para vê-los irem lutar e serem mortos pelas forças invencíveis dos Estados Unidos. Ele viu o Japão queimar, ele viu os antigos templos e santuários serem totalmente aniquilados, ele viu bombardeiros enegrecerem o sol, e ele viu como um pilar de fumaça negra subia de cada cidade no Japão e envenenava o ar que ele respirava. Ele viu o Japão cair da glória para uma nação miserável, dependendo de suprimentos de comida e roupas dos seus conquistadores. O cheiro da fumaça e o cheiro dos mortos, os berros daqueles que foram deixados para morrer lentamente, o choro das mães que perderam seus filhos e esposas que nunca mais iriam ver seus maridos, o medo, o ruído ensurdecedor dos B-29's voando sobre sua cabeça aos milhares, os clarões como os de trovões por todo o país quando as bombas explodiam em áreas residenciais, os flashes de luz na escuridão, a espera no rádio para poder ouvir a voz do Imperador pela primeira vez, somente para anunciar a rendição, a humilhação de implorar comida aos soldados... os intermináveis funerais e famílias arruinadas e lares destruídos...

Mestre Gichin Funakoshi, o "Pai do Karatê Moderno", morreu em 26 de Abril de 1957. Em seu túmulo negro, em forma de cruz, estão as palavras "Karatê Ni Sente Nashi" (No Karatê não existe atitude ofensiva). Pouco tempo antes de morrer ele pode dizer:

"ACHO QUE COMEÇO A ENTENDER O QUE

É UM VERDADEIRO TSUKI (Soco)." Gichin Funakoshi

Nascimento:1886     Falecimento:26-04-1957

 

Karatê Unaí

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